A Senhora
Ela é linda, ela é charmosa. Para onde olhar ela está lá, deslumbrante e me faz um apaixonado!
Encontrei uma senhora de incomparável elegância. Estava ela caminhando com altivez em uma das ladeiras de Montmartre, enquanto a vitrola de um café entoava baixinho La Boheme. A luz emanada por aquela senhora refletia sobre as paredes altas da Sacré Coeur e desenhava naquela catedral de esplendor uma tela de magistral amor.
Também me deparei com a senhora charmosa em um dos barcos que deslizavam pelo rio Sena. Carregava um semblante sereno e expressava um olhar de paz.
Quando o barco passou sob a ponte Alexandre III, a mulher se sentou no convés. Era solene admiração.
Um músico executava em seu acordeon a inesquecível La Vie en Rose. E o leito do Sena se deleitava em uma dança suave sob o leito de um céu azul infinito. O velho rio levava o barco e a senhora. Levava também consigo um vasto acervo de história e estórias.
Quando estive no Museu de Orsay, lá estava a personificação da elegância. Esperava ansiosamente o momento mágico de comungar da arte com os anfitriões imortais: Van Gogh, Cézanne, Degas... Quando então entramos, vi a silhueta da senhora se desmaterializar e tornar-se cor a vibrar e se misturar com tantas obras geniais.
No Louvre, a senhora era a reprodução fiel da veneração. Corria como energia viva por entre os corredores largos e, vez ou outra, parava para fazer uma breve saudação: La Gioconda, Venus de Milo, Vitória de Samotrácia, Virgem dos Rochedos...
Na Notre Dame, vi-a sentada em um canto, bem próxima da imagem de Joana D'arc... Chorava copiosamente. Sentia em seu coração a dor sentida no coração machucado de Nossa Dama. Mas estava certa de que a Dama, então abatida, logo se reergueria sob a proteção divina e se faria plena de beleza e magnitude.
A senhora também gostava de trafegar despretensiosamente pela Champs-Élysées. Olhava uma vitrine aqui, outra ali. Encantava-se com a moda que logo deixaria de ser moda para dar lugar a outra moda. Modificação.
Ao chegar na base do Arco do Triunfo, ergueu a fronte e colocou a mão sobre o peito em sinal de respeito e gratidão.
Encontrei-a também no alto da Torre Eiffel. Parecia embevecida pela paisagem arrebatadora.
Lá embaixo, o Trocadéro... O Champ de Mars... Mais à frente, o Palais Garnier, com sua formosa suntuosidade em homenagem a música. Perto, a Lafayette Galeries, com seus encantos mil.
Embora a senhora estivesse extasiada, aproximei-me dela. Senti um perfume de aroma indescritível. Tentei fixar meu olhar em seus olhos, mas o brilho de sua luz ofuscou minha visão. De repente, o tempo se curvou aos desejos daquela senhora. Fez-se noite sem avisar.
Do alto da torre, luzes sem fim iluminavam o vasto berço do iluminismo, infinitas estrelas piscavam no céu e transformavam-se em desenhos de constelações do saber: Voltaire, Victor Hugo, Rousseau, Locke, Montesquieu, Dumas, Descartes...
Enfeitiçado pela senhora e pelo cenário onírico, perguntei-lhe respeitosamente quem era ela. Respondeu-me com uma voz que parecia um beijo suave no ouvido: "Je suis Paris.".
Apaixonei-me.